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Hideo Kojima – Um Pendrive e Ideias para as Próximas Gerações

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hideo kojima

Esse é o loot que ele está deixando com o seu assistente

Em uma noite quente de verão de 1977, uma ambulância atravessa as ruas de Kawanishi. Dentro dela estão Kingo Kojima e seu filho Hideo, de 13 anos. Eles se encaram em silêncio. Sabem que aquele é o último momento juntos.

Kingo morre antes de conseguir dizer suas últimas palavras. O silêncio que ficou marcaria Hideo para sempre. Mais tarde, viraria tema recorrente em suas histórias: pais e filhos separados por tempo, guerra ou morte.

Mesmo com a partida precoce, Kingo deixou um legado forte. Transmitiu ao filho o amor pelo cinema e pela cultura ocidental. E, acima de tudo, a coragem de seguir seus próprios sonhos.

Foi essa herança — mais memética do que genética — que impulsionou Hideo a ignorar conselhos e críticas. Ele escolheu criar jogos em uma época em que isso ainda era visto com desconfiança. Um ato de ousadia. E, no fundo, uma homenagem silenciosa ao pai.

Hideo Kojima e sua esposa debatem o nome do filho: "Michael" ou "Fragile-Babyman" : r/TwoBestFriendsPlay

É importante falar sobre legado — especialmente o legado cultural e de ideias — ao se deparar com mais uma das declarações peculiares de Hideo Kojima.

Em entrevista à revista Edge, o lendário game designer revelou que entregou ao seu assistente pessoal um pendrive com ideias para futuros jogos. Um testamento criativo.

Hideo Kojima will be inducted into gaming hall of fame - CNET

“Para quando eu partir”, afirmou.

À primeira vista, pode parecer apenas mais uma excentricidade de um criador excêntrico. Kojima, afinal, continua ativo, saudável aos 61 anos, com estilo de rockstar e presença digital que deixaria muitos jovens para trás.

Mas ao lembrar da história pessoal dele — marcada pela perda repentina do pai ainda na adolescência —, esse gesto ganha outro peso. Para Kojima, a morte é uma entidade que chega sem aviso, sem chance para despedidas.

É natural que ele pense no que deixará para trás.

Essa obsessão com a passagem de bastões e a herança entre gerações sempre esteve presente em sua obra.

PING: Kojima não participa de remake de Metal Gear Solid e mais; veja

“Encontre algo em que acreditar e, quando encontrá-lo, passe-o para o futuro.”

É um dos grandes temas que atravessa a série Metal Gear Solid. Desde o jogo de 1998, que não só atualizou a franquia iniciada no MSX como mergulhou em dilemas existenciais, Kojima usou o pano de fundo da espionagem e da guerra para tratar de algo mais humano: o fardo da herança.

Pais e filhos. Mentores e aprendizes. Velhas ideologias e novas formas de pensar. Para Kojima, o que herdamos, o que escolhemos preservar e o que deixamos morrer são decisões que moldam não apenas o presente, mas todo o futuro.

Dessa forma, o pendrive entregue ao assistente não é só uma coleção de ideias. É, possivelmente, o símbolo máximo de tudo que ele sempre tentou nos dizer.

Em Metal Gear Solid, Solid Snake é um clone de Big Boss, mas o verdadeiro conflito está além da genética. Enquanto Big Boss via a guerra como única verdade, Snake questiona seu papel, dividindo-se entre soldado e pensador. Ele luta não só contra inimigos, mas contra o legado que herdou.

Seu irmão, Liquid Snake, vive o mesmo dilema: são apenas cópias ou podem escolher o que deixar para o futuro? Essa tensão entre destino e escolha é central na série.

Em Metal Gear Solid 2, Kojima aprofunda o tema. Os Patriots tentam controlar a cultura e a informação, decidindo o que deve ser passado adiante. Raiden, manipulado por eles, simboliza a luta por autonomia.

Mads Mikkelsen & Hideo Kojima today. https://twitter.com/Kaizerkunkun/status/1173854263774040064 – @baba-yaga-not-only on Tumblr

A pergunta de Kojima é direta: “somos livres para definir nosso legado ou apenas repetimos o passado? A resposta está na escolha. Escolher o que manter, o que abandonar e dar sentido àquilo que deixamos para o futuro.”

Após sua saída da Konami, Hideo Kojima decidiu fundar a Kojima Productions como um estúdio independente

Um passo que, à primeira vista, poderia parecer natural para alguém com mais de trinta anos de carreira e sucessos consagrados. No entanto, a realidade foi bem mais complicada.

Apesar de sua fama, Kojima teve dificuldades para conseguir o financiamento necessário. Curiosamente, ele só obteve o empréstimo porque o gerente do banco era fã de seus jogos.

Esse detalhe aparentemente trivial ilustra algo muito maior: o poder duradouro de um legado artístico.

Esse conceito de legado, aliás, sempre esteve presente na obra de Kojima, mas foi em Death Stranding que ele assumiu uma forma mais clara e emocionalmente profunda.

Diferentemente da série Metal Gear, onde os laços entre gerações eram impostos pela genética e frequentemente retratados como uma prisão, Death Stranding propõe outra visão.

O que une as pessoas, aqui, não é o sangue, mas o cuidado. O que se transmite não é apenas um DNA, mas uma escolha consciente sobre o que vale a pena carregar para o futuro.

Ao longo do jogo, essa ideia se manifesta não apenas na narrativa, mas também na própria jogabilidade. O mundo de Death Stranding é povoado por objetos deixados por outros jogadores — escadas, pontes, cordas — que ajudam quem vier depois.

Esses elementos funcionam como heranças colaborativas: você escolhe o que deixar e como isso pode facilitar a jornada de outro. Em outras palavras, o jogo nos lembra que o legado não precisa ser um fardo; ele pode ser um presente.

Por isso, quando Kojima revelou ter deixado com seu assistente um pendrive contendo ideias para jogos futuros, a notícia, embora curiosa, não parece uma excentricidade isolada.

Na verdade, ela soa como uma continuação lógica de tudo o que ele já disse em suas obras. Desde Metal Gear Solid 2, onde já se discutia o que vale a pena transmitir para a próxima geração, até Death Stranding, onde cada entrega é um gesto de conexão, Kojima vem elaborando uma mesma mensagem: somos parte de uma corrente maior, e precisamos escolher com cuidado o que deixamos nela.

Vale lembrar que, ainda em 2001, após o lançamento de Sons of Liberty, ele já tentava passar o bastão da série Metal Gear.

No entanto, o mundo dos games — e talvez o próprio Kojima — ainda não estavam prontos para isso. Com o tempo, a tentativa virou até piada entre os fãs, com trailers como o de Metal Gear Solid 4 dizendo “Não há lugar para Hideo”, apenas para que ele voltasse logo depois.

Hoje, a franquia vive de remakes e remasterizações, sem um sucessor claro. É como se seu legado estivesse suspenso, aguardando quem tenha coragem — e visão — para continuar.

Por outro lado, esse momento histórico exige uma reflexão importante.

O meio dos videogames, ainda jovem, está prestes a viver algo inédito: a passagem de geração entre seus criadores. Nos cinemas, vimos sucessores espirituais de Kurosawa, Hitchcock ou Welles darem continuidade a seus estilos, adaptando-os ao seu tempo.

Nos jogos, uma nova geração de criadores terá que herdar — e reinventar — o trabalho de nomes como Miyamoto, Romero, Carmack, Amy Hennig, Roberta Williams e o próprio Kojima.

Portanto, o famoso pendrive de Kojima não deve ser visto apenas como um capricho. Ele representa um gesto de responsabilidade.

Uma ponte entre o que foi feito e o que ainda pode ser. Como nos ensinou Death Stranding, não se trata apenas de preservar o passado, mas de escolher com sabedoria o que vale a pena carregar para o futuro.

Afinal, como ele nos lembra em todos os seus jogos: continuar transmitindo ideias, valores e sonhos é a única forma real de sobrevivermos ao tempo.

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